"Os maiores terroristas em Angola são aqueles que estão no Governo, nos transportes, em cargos ministeriais que são os responsáveis pela atual crise socioeconómica, começando pelo próprio Presidente da República [João Lourenço]. Isto é que é terrorismo do Estado, desvirtuar a nação, destratar da soberania do povo no país", afirmou, quando questionado sobre as últimas detenções de cidadãos acusados de terrorismo e outros crimes.
Em entrevista à Lusa, Marques disse que o caso das últimas detenções em Angola "é sintomático de que o Presidente da República quer resolver a crise económica e social [do país] com repressão".
"Mas, é preciso entender que as balas não alimentarão a população", acrescentou.
Sobre as consequências dos tumultos de finais de julho, na sequência de greve dos taxistas, que resultaram em 30 mortos e mais de 200 feridos, Rafael Marques considerou que a postura das autoridades agrava ainda mais o ódio da população.
O Governo "pode matar centenas ou milhares de cidadãos, só vai agravar o fosso e o ódio entre a população e o Governo, alias, nesse caso, especificamente, o Presidente da República", notou.
"Porque até agora não ouvimos falar em detenção de agentes da polícia que disparou indiscriminadamente, de forma cobarde, contra cidadãos que corriam na direção contrária que foram atingidos pelas costas, isto é crime e não ouvimos falar disso", criticou.
De acordo com o ativista, o Governo de Angola precisa de medidas sérias, de reformas, de diminuir o despesismo público e "acabar com a promoção da incompetência e da roubalheira".
"Há fome a empurrar cada vez mais pessoas a procura de lixo para sobreviverem", apontou, mas também "é preciso reconhecer que o Presidente (...) já deixou de governar (...), o que tem aqui é a manutenção do poder e isso é muito triste".
A maior parte dos líderes das associações dos taxistas, cooperativas de taxistas, associações de moto taxistas e de lotadores foram detidos nas últimas semanas pelo Serviço de Investigação Criminal (SIC) por suspeita dos crimes de associação criminosa, incitação à violência, atentado contra a segurança nos transportes e terrorismo, "consubstanciados em fortes indícios do seu envolvimento na promoção dos atos de vandalismo e arruaça contra bens e serviços públicos e privados", protagonizados entre 28 e 30 de julho.
Dois cidadãos russos e mais dois angolanos, incluindo um jornalista, foram ainda detidos em Luanda, sob suspeita dos crimes de associação criminosa, falsificação de documentos, terrorismo e financiamento ao terrorismo.
Para o também diretor do portal de notícias Makaangola, só unidos os angolanos conseguirão encontrar soluções pacíficas e efetivas para "remover os indivíduos que estão a levar Angola para o abismo", lamentando a falta de uma defesa clara, sobretudo no seio da classe dos taxistas, após as últimas detenções.
Ainda segundo Rafael Marques, existem inclusive pessoas dentro do MPLA (partido no poder) que entendem ser necessário "haver mudanças, gerar pressão para (...) que haja uma causa comum que permita os angolanos juntarem-se não para fazer confusão, mas para defenderem a sua soberania". E ecordou que a soberania, à luz da Constituição angolana, reside no povo.
"Essas prisões são para fragmentar mais as pessoas, mas isso não deve impor o medo e é extraordinário que, agora, os taxistas não venham em defesa dos seus líderes, porque falta liderança. Por isso é que neste país elimina-se a inteligência para que a mediocridade esteja sempre em cima, nas instituições do poder, na sociedade civil, na oposição e a mediocridade comande a manutenção do povo no obscurantismo", concluiu.
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