As garantias de segurança, exigidas por Kyiv e pelos aliados europeus, estiveram no centro das reuniões alargadas na segunda-feira em Washington, e inicialmente o Presidente russo, Vladimir Putin, indicou que estaria pronto para aceitá-las.
No entanto, já hoje, o chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov, arrefeceu as expectativas e comentou que não haverá garantias de segurança sem a participação de Moscovo nas discussões, ao mesmo tempo que acusou os líderes europeus de promoverem uma "escalada agressiva da situação" e de não proporem "nenhuma ideia construtiva".
Eis algumas perguntas e respostas sobre as garantias de segurança:
O que se entende por garantias de segurança?
A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, e o enviado especial da Casa Branca, Steve Witkoff, indicaram que as garantias seriam inspiradas no artigo 5.º da NATO (princípio da defesa mútua), que ofereceria proteção a Kyiv contra novas invasões russas, mas manteria a Ucrânia fora da Aliança Atlântica.
No entanto, Oleg Ignatov, analista-chefe para a Rússia no International Crisis Group (ICG), observou que "não se sabe muito sobre o que este modelo pode implicar".
Se fosse levado à letra, caso a Rússia inicie as hostilidades de novo após um acordo de paz, os países que oferecem as garantias devem decidir como apoiá-la, como se lê no artigo 5.º do tratado da Aliança Atlântica.
Isso significa que uma nova agressão russa não implicaria automaticamente uma guerra com os países da NATO, mas que estes "podem decidir fornecer armas à Ucrânia", como já hoje acontece, bem como outros sistemas não militares, assistência política, e humanitária, segundo o analista citado pela agência noticiosa espanhola EFE.
O que quer a Ucrânia?
Antes de se reunir na Casa Branca com o Presidente norte-americano, Donald Trump, e vários dos principais líderes europeus e o secretário-geral da NATO, Mark Rutte, Zelensky advertiu que Moscovo "continua a cometer massacres para manter a pressão sobre a Ucrânia e a Europa e humilhar os esforços diplomáticos".
Como a pretensão da adesão de Kyiv à NATO surge como "uma linha vermelha" para o Kremlin, Zelensky defendeu que só "garantias de segurança fiáveis" podem impedir novas operações da Rússia, que "não deve ser recompensada pela sua participação nesta guerra".
Além disso, pretende o reforço das forças armadas ucranianas, a ser financiado pela Europa ou pelos Estados Unidos.
Como poderiam ser aplicadas as garantias?
A "Coligação dos Dispostos", de cerca de 30 países, sobretudo europeus, liderada por Paris e Londres e que também integra Portugal, afirma estar pronta a apoiar a Ucrânia para impedir o reatamento das hostilidades.
Segundo várias fontes mencionadas pela agência France-Presse (AFP), o plano está em preparação desde fevereiro e inclui o apoio à regeneração do Exército de Kyiv e meios aéreos para proteger os céus ucranianos e o tráfego no Mar Negro.
Está previsto um destacamento terrestre na Ucrânia de "alguns milhares de soldados", segundo sinalizou anteriormente o Presidente francês, Emmanuel Macron, que "não visam manter uma linha da frente ou envolver-se num conflito intenso, mas demonstrar solidariedade de uma perspetiva estratégica".
A França, o Reino Unido e os países bálticos manifestaram a sua disposição nos últimos meses, mas "aqueles que têm as maiores tropas terrestres na Europa não querem ir para lá", refere à AFP o investigador independente Stéphane Audrand, dando os exemplos dos polacos e dos alemães.
Muitos países europeus exigem ainda um "backstop" (apoio de retaguarda) norte-americano como condição para qualquer compromisso.
As garantias de segurança não estavam contempladas nos acordos de Minsk, celebrados entre a Moscovo e Kyiv em 2014 e 2015 como forma de silenciar o conflito já em curso na região do Donbass, no leste da Ucrânia.
Posteriormente, em 1994, a Rússia, os Estados Unidos e o Reino Unido comprometeram-se a respeitar a integridade territorial da Ucrânia, em troca da renúncia ao uso de armas nucleares, mas "não resultou", declarou Zelensky à chegada a Washington na segunda-feira.
Os Estados Unidos estão dispostos a participar?
Embora Donald Trump parecesse disposto a fornecer garantias de segurança, na terça-feira descartou o envio de tropas norte-americanas para a Ucrânia e remeteu a liderança do processo para os países europeus, uma ideia que Moscovo vê com hostilidade.
Os ucranianos "não farão parte da NATO, mas temos as nações europeias, e estarão na linha da frente (...). Não acho que isso seja um problema. Acho que Putin está cansado disso. Acho que todos estão cansados disso", disse em entrevista à Fox News.
Washington tem mantido uma posição sinuosa sobre o conflito, tendo Trump já defendido um cessar-fogo, exigido por Kyiv como primeiro passo para um acordo de paz, e depois o seu contrário, a ameaça reiterada de novas sanções contra Moscovo como forma de pressão para um acordo de paz, até ao momento nunca executada.
O envio de armamento norte-americano já foi suspenso e reatado mais do que uma vez e, entretanto, ao abrigo de um instrumento acordado na NATO, vários países-membros europeus têm assegurado o financiamento das transferências militares de Washington para Kyiv.
O que diz a Rússia?
Na cimeira bilateral realizada na sexta-feira no Alasca, que conduziu Vladimir Putin, procurado por crimes de guerra pelo Tribunal Penal Internacional, a um regresso aos Estados Unidos e a um grande palco diplomático ocidental, o líder do Kremlin disse ao lado de Trump que estaria pronto a aceitar garantias de segurança.
"Concordo com o Presidente Trump. Ele disse hoje que, sem dúvida, a segurança da Ucrânia também deve ser garantida. Estamos prontos para trabalhar nisso", observou, sem adiantar pormenores.
Mas Putin não "concordará com qualquer garantia de segurança que seja contra a Rússia", explicou Oleg Ignatov, pelo que é pouco provável que concorde com garantias de segurança que envolvam apenas países ocidentais.
Além disso, sublinhou o analista do ICG, Moscovo quer também discutir garantias para a Rússia, caso, por exemplo, a Ucrânia queira recuperar territórios ocupados.
"A Rússia poderá apenas concordar com garantias de forma vaga" e "mal definida", assinalou, pelo seu lado, à AFP Matthias Matthijs, analista do Conselho de Relações Externas (CFR).
Já hoje, Serguei Lavrov advertiu que qualquer processo sobre as garantias de segurança ocidentais a oferecer à Ucrânia sem considerar a posição de Moscovo será "utópico e é um caminho que não leva a lado nenhum".
Além disso, acusou a Europa de conduzir a uma "escalada agressiva da situação" sem propor "nenhuma ideia construtiva", apenas com o objetivo de "manter os Estados Unidos na corrida ao armamento" da Ucrânia.
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