O despacho de arquivamento, a que a agência Lusa teve hoje acesso, conta que o inquérito teve origem numa notícia, de 2018, a qual referia que na celebração de dois contratos para prestação de serviços entre a CML e uma sociedade de consultoria do histórico socialista e ex-autarca (presidiu às câmaras de Idanha-A-Nova e de Castelo Branco) "não terão sido observadas as regras da contratação pública, visando beneficiar Joaquim Morão".
No inquérito, que levou à realização de várias buscas, nomeadamente no município, estava em causa a suposta prática de crimes económicos, como burla, participação económica em negócio, abuso de poder ou prevaricação, e tinha cinco arguidos: Joaquim Morão, António Realinho, sócio de Joaquim Morão, Luís Dias, amigo de Joaquim Morão, Manuel Salgado, ex-vereador do urbanismo da CML e Maria Helena Bicho, ex-diretora municipal de projeto e obras da autarquia lisboeta.
O MP concluiu que foram celebrados, entre a CML e a JLD. Consultoria, de Joaquim Morão, dois contratos de prestação de serviços: o primeiro em 25 de junho de 2015 (de 22.500 euros) e outro em 24 de março de 2016 (de 73.788 euros), "tendo como intervenientes, do lado da Câmara Municipal, o vereador Manuel Salgado, e do lado da sociedade, Joaquim Morão".
O MP frisa que Joaquim Morão "efetivamente realizou trabalho para a CML, através do acompanhamento de reuniões de trabalho, controlo de prazos estabelecidos nas operações em curso e variados contactos com entidades intervenientes, nomeadamente, empreiteiros, serviços camarários, empresas municipais relevantes (EMEL, SRU, Metropolitano de Lisboa, EPAL), Tribunal de Contas e outras entidades públicas".
A investigação revela que "Joaquim Morão reportava o seu trabalho ao presidente Fernando Medina e ao vereador Manuel Salgado".
O MP conta que, entre janeiro e fevereiro de 2015, foi Fernando Medina, então vice-presidente da câmara com o pelouro das finanças, quem "solicitou a Joaquim Morão que auxiliasse a autarquia nas obras em curso, dada a sua experiência, adquirida enquanto autarca em Idanha-a-Nova e Castelo Branco".
Em 06 de abril de 2025, Fernando Medina assumiu formalmente a presidência da CML.
"No essencial e do que resulta das diligências efetuadas, Joaquim Morão foi escolhido por ser a pessoa indicada para exercer aquelas funções, que exerceu, numa situação particular vivida na Câmara Municipal de Lisboa de grande execução de obras, sendo a pessoa com especiais apetências técnicas para o trabalho a exercer, atenta a experiência acumulada, em funções semelhantes, enquanto autarca em Castelo Branco", sublinha o MP.
Segundo a procuradora Tânia Agostinho, "de acordo com os depoimentos das testemunhas", Joaquim Morão "exerceu corretamente as funções em causa".
"Mesmo as testemunhas que não estavam de acordo com a 'presença' do mesmo na Câmara Municipal, concordaram que a sua contratação foi uma mais-valia", lê-se no despacho de arquivamento.
O MP não encontrou indícios da prática de crimes, mas admite a possibilidade de o antigo autarca de Castelo Branco ter praticado uma infração financeira.
Em causa está o recebimento, através da sociedade criada por Joaquim Morão, no âmbito dos dois contratos celebrados com o município de Lisboa, "competindo ao Tribunal de Contas aferir da existência ou não de infração financeira".
"Uma vez que, seguindo o entendimento do Tribunal Central Administrativo do Sul, em acórdão datado de 28/06/2018, no processo 2638/14.0BELSB, relatado por Helena Canelas, o aposentado da Caixa Geral de Aposentações pode exercer atividade para entidades públicas mediante remuneração, através de uma sociedade, ainda que unipessoal, desde que nesta não auferia remuneração", aponta a procuradora.
Leia Também: Russiagate: CML recorrerá "até ao limite" para "proteger contribuintes"